Tuesday, April 12, 2011

pensava que de volta.

quando cheguei na festa percebi como logo fiquei de lado, encostado na parede, um copo na mão, ouvindo a música, vendo as pessoas passarem e conversando com os amigos mais próximos sem qualquer pretensão. passavam por mim os mesmos rostos daquela época, e eu teria que parar para contar antes de saber há quanto tempo eu não via um ou outro, há quanto tempo eu não sequer aparecia naquele lugar. tinha mudado de cidade, de emprego, de profissão, comprado novas roupas, desenvolvido outras teorias, ouvido outros sons. por algum acaso eu estava de volta àquele bairro, com aquela gente que por uma temporada fora tão distante. cumprimentei o guilherme e ele começou a lembrar de histórias como as que sempre tinha contado. vi também o joão, o matias, o franco. sorriam ao falar comigo, falavam uma ou outra besteira e eu só conseguia pensar que eram exatamente os mesmos, como que congelados no tempo.

fui embora sentindo o estranhamento de voltar e ver que estava tudo como tinha deixado e não conseguia não pensar em como era possível tudo estar tão parado em seu lugar. fui embora e não consegui não pensar em como eu havia mudado tanto, e, ao mesmo tempo, não mudado. era como na última semana. depois de meses, quase um ano, talvez, tinha encontrado a gabriela. e, enquanto ia para o cinema, no qual tínhamos combinado de estar às oito horas em ponto, eu sabia que ela ia atrasar, como sempre, mas não sabia o que eu mesmo ia sentir. eu precisava daquela jogada arriscada, precisava ver se faria bem ou mal, se as coisas continuavam em seu caminho ou se tudo havia de fato explodido.

então ela havia aparecido exatos vinte e três minutos depois, arrumando o cabelo e dando um sorriso um tanto sem graça ao me ver. beijos no rosto e começamos um papo trivial e em pouco tempo eu sentia que ainda estava ali, o magnetismo, algo de diferente, a presença que me atraía e que tinha me prendido desde sempre. acabamos não vendo o filme e, entre as diversas conversas em um bar ao lado do cinema, o tempo avançou. na despedida, antes de qualquer coisa, olhei bem naqueles olhos, aqueles lindos olhos cinzentos que eu quase podia dizer que eram capazes de matar ou criar vida. ela desviou o olhar e então a cumprimentei e fui embora.

eu agora achava engraçado como os caras da cidade ainda falavam das festas na rua ou do futebol no salão da escola, como o marcel ainda trabalhava na vendinha e o franco continuava falando que no ano que vem voltaria pra faculdade. mas não conseguia achar engraçado como eu continuava desviando os olhos das pessoas e das coisas pra fixá-los no rosto da gabriela, como eu me concentrava observando o movimento de suas mãos, sentia quase um prazer vendo seus dentes brancos em sorrisos ocasionais e despretensiosos.

fui embora da festa achando que, apesar de tudo que havia passado e de tudo que ainda acontecia e das pessoas de quem gostava estarem ali, aquele não era mais meu lugar.

fui embora do cinema achando que, apesar de tudo que havia passado e de tudo que ainda acontecia, a gabriela sentia que estar comigo não era mais seu lugar.

Monday, February 22, 2010

"e aí, tudo bem?"
"tudo e aí?"
"não. aqui não. nem um pouco".
"..."
"..."

foram-se os diálogos geniais. foi-se tudo.

Friday, January 15, 2010

verão, 2010

O VERÃO MAIS INVERNAL DE QUE SE TEM NOTÍCIA, manchetava o principal diário de minha cidade. os céus se confundiam nos dias entre cinza e azul. os metereologistas errando todas as previsões. às vezes era tanto frio dentro da gente que parecia que ia nevar, embora toda a ciência conhecida até então negasse qualquer possibilidade. Os termômetros marcam temperaturas diferentes a cada hora, entre os 5º e os 40º Celsius no ambiente externo. Nos corações, frio e calor também se alternam, embora o primeiro tenha levado vantagem ao longo dos últimos cinco meses.

PSICÓLOGOS ALERTAM PARA ONDA DEPRESSIVA - Os trilhos do metrô e as grandes pontes, maravilhosas obras da arquitetura brasileira, chegaram quase a registrar congestionamentos durante a última sexta-feira. Ao fim da noite, solitários se arrastaram pelas calçadas em direção a algum fim digno. Houve alguma confusão, tumulto causado entre os que desistiam no derradeiro momento e os revoltados que aguardavam por sua vez. Estes últimos se exaltaram ao ver que, devido a desistentes, precisaram encarar mais alguns minutos de angústia.

Os suicidas exaltam a ponte Octávio Frias de Oliveira e seu design moderno e acalentador para o último grito. os urbanistas destacam a recente inauguração da estação sacomã do metrô, com portas de vidro para evitar usuários na linha. "Vamos também cercar as pontes e criar um programa para garantir menos amores perdidos e desilusões de todo outro tipo", garantiu o governador em entrevista a uma emissora de tevê.

RELIGIOSOS ALERTAM PARA O FIM DOS TEMPOS - Os fiéis da Igreja dos Últimos dias têm saído assustados dos últimos cultos, onde o Reverendo Jonas constantemente faz referências ao apocalipse. Segundo ele, as alterações no clima, os suicídios, a depressão e o sucesso da música emo são sinais claros de que o Homem se afogou em si mesmo. "É um Dilúvio sem Dilúvo", prega.

O sem teto Matias Almeida, que há sete anos prevê o colapso mundial, acredita que agora a profecia será concretizada. "Desta vez não passa. Vamos todos morrer na angústia dos tempos modernos". Matias realiza seus cultos todos os dias na Praça da Sé com uma bíblia surrada e um terno que encontrou no lixo. "Bem aventurados os que não acreditam, porque morrerão sem desilusão", gritou na última sexta, assustando até mesmo seus fiéis. Boatos dão conta de que teria enlouquecido pela terceira vez.

VENDAS DE CERVEJA BATEM RECORDE; FERNET É NOVA MODA DO VERÃO 2010 - A gigante do ramo cervejeiro InBev anunciou a maior produção de sua história. Mesmo nas noites frias do atual verão, as pessoas têm procurado os bares e mergulhado em copos. As sarjetas parecem cada vez mais cheias. "Estamos preparando uma ação policial contra os bêbados", adianta o prefeito da cidade.

Outra sensação nos balcões de fórmica é o fernet, drinque mais conhecido pelas terras argentinas. "Amargo e com sabor de tango", explica o degustador Marcelo Chambers. "A vida atribulada e a falta de perspectivas e o vazio e a angústia explicam a alta nas vendas do fernet", analisa o psicólogo e alcóolatra Paulo Passos.

FONTES PREVÊEM FIM DOS HORIZONTES PERDIDOS - Interlocutores ligados aos idealizadores do Horizontes Perdidos têm comentado nos bastidores sobre a possibilidade de encerramento do que era conhecido como espaço de besteirol chulo e tentativas de poesia suburbana. Os donos do espaço não comentam a afirmativa. Um deles, porém, teria sido visto em um boteco do centro a falar mal sobre as próprias ideias. "Nada tem levado a nada e os horizontes já estão tão perdidos que também me perdi deles", explicou a um confidente após dez garrafas de Brahma. O sujeito reclamou também do preço da sua cerveja preferida. "Ultimamente tudo que eu gosto e quero tem me parecido caro demais. Não me refiro somente à Brahma e nem somente ao dinheiro".

Thursday, March 05, 2009

verão, 2009

sol, calor, mas alguma sombra persiste. 
não há de ser nada demais, 
dizem,
talvez um presságio do outono
inverno distante
vento
algum presságio ou medo que seja. 
não há de ser nada demais,
dizem,
o céu está azul
e a vida segue como em todos os dias. 

Tuesday, March 03, 2009

antigas escrituras







Sentado frente à fogueira, contou ao jovem histórias ancestrais. Lendas mais antigas que o próprio tempo. O fogo estalava e fazia subir aos céus uma fumaça leve enquanto esquentava a noite. Nos olhos do xamã, rugas mostravam que o conhecimento vinha com o tempo e alguma dose de pesar. Pois havia ali alguma espécie de sombra, daquelas que permaneceriam obscuras mesmo sob o sol do meio-dia. Vestido com roupas sóbrias, cabelos longos desarrumados por sobre a cabeça, o rosto era sisudo embaixo do grande chapéu cheio de adereços. Era sempre assim, cara fechada, olhos de sombra, a boca se movendo lentamente e quase sussurrando as palavras em um tom que ameaçava e acolhia. 

O garoto, que tremia de frio e expectativas, agora estava mais calmo, efeito da fogueira e das palavras que relembravam o que não estava registrado em qualquer memória. A tradição mandava que os jovens, quando próximos de completarem os 21 anos da maioridade total, deveriam ser levados ao xamã. Somente assim poderiam conhecer as histórias do bem e do mal abrigadas somente na cabeça daquele sábio e em arcas guardadas em cavernas profundas de localização desconhecida. Ficou curioso pelo modo como ele poderia saber tudo sobre as coisas dos três mundos e parecia falar com precisão sobre passado, presente, futuro.

"Como pode olhar através das pessoas e dos dias como se fossem a água do mais puro rio?" perguntou, logo arrependendo-se da ousadia. 

O xamã fechou os olhos. Sereno, abriu-os novamente, deixando suas pupilas mostrarem uma escuridão maior do que a daquela noite de frio no deserto. 

"Todos recebemos a dádiva da visão. Percebi sua atenção sobre meus olhos. Teu olhar pesa, mas não vê". 

Apontou para a fogueira. As chamas crepitavam. 

"Olhe para o fogo. O calor embaça a visão. Olhe diretamente para o sol. A luz ofusca. Meus olhos trazem a sombra da noite. Às vezes, algo se esconde nela. Mas, ainda assim, vejo mais do que os que tem o olhar claro e cristalino". 

O velho desviou o olhar, fitando um horizonte perdido. "Não é algo que se aprende da noite para o dia, você sabe". 

Fechou os olhos, sentindo antecipadamente a dor. Um golpe, seco. Outro, agora quente, sangue. Não reagiu. Sessenta anos de diferença entre os dois fariam com que qualquer tentativa fosse inútil. Pôde sentir ainda a agonia e o medo antes do derradeiro sono. Dois buracos vazios no rosto sangravam como lágrimas, violados. 

Já longe dali, o joven carregava sangue e sombras em suas mãos. Olhos de pupilas castanhas agora sem vida, mas que pareciam ainda assim observar sagazmente. Levantou um deles ao céu e encarou-o. Sentiu como se a noite avançasse pelas horas, a luz das estrelas diminuindo e, mesmo a fogueira, um tanto distante, parecia sumir de vista. 

Percebeu então que havia algo a mais. Uma linha preta fazia como que uma trilha por entre a paisagem. Correu, seguindo-a, consciente de que tinha pouco tempo para descobrir o significado daquilo antes de ter que disparar em fuga, quando descobrissem o corpo do xamã. Talvez fosse mesmo aquele traço riscado no ar uma rota de escapatória. 

Andou muito, voou pelo deserto, entrou em túneis, passou por mato cerrado e lagos secos. E foi no leito de um rio já inexistente que viu o sinal desaparecer, entrando na areia. Escavou. Rasgando os dedos, ávido, cavou a terra. Que pareceu de repente ceder. Surgia então um grande buraco, oculto por tantos anos que mesmo com a visão roubada não poderia contar. 

Havia ali uma arca de madeira antiga, mas conservada como se tivesse sido esculpida na semana anterior. Não havia chave. Abriu-a para encontrar um manuscrito, alguma tinta ancestral sobre pele de cordeiro, como nos papiros antigos. Era um dialeto antigo, dos que apenas ouvia falar quando conversava com os anciões. Mas conseguiu entender. De alguma maneira. 

"Aquele que cometeu o ato vil não foi recompensado. Embora não tivesse mais a luz a ocultar sua visão, a ganância e o desejo o deixavam mais cego do que mil sóis". 

Monday, May 12, 2008

Para onde é que vamos fugir?

Um grito às dez horas da manhã, de uma segunda-feira ensolarada, acordou três vagabundos. Eles, por sua vez, não sabiam o que deveriam fazer. O mais sensato ignorou e continuou a roncar. “ZzzzZzzzzZ.”O louco berrou junto. “Sim, estamos vivos. Vocês vão perder essa guerra.” O sonhador entendeu o grito como uma mensagem, que talvez estivesse codificada. “Quem são vocês? Será que posso ajudar?”
Às dez horas e cinco minutos, da mesma segunda, a sensatez foi acordada pela loucura, que estava dominada por sonhos.

- Todos ouviram?

- Sim.

- Sim.

- Então vamos ajudar eles.

-Você é louco, ajudar a quem? Estamos em meio a uma selva de pedra, aqui ninguém ajuda ninguém. E, afinal, gritos são normais por aqui.

- Vamos ajudá-los, eles sobreviveram ao ataque.

- Meu caro amigo Roberto, se nos seguir poderá conhecer o belo, ou apenas o nada, mas saiba que é uma aposta. Se ajudarmos alguém poderemos ser libertados dos nossos pecados, ou, então, achar o paraíso real.

- Francisco e João, eu vou com vocês porque preciso protegê-los. Mas fiquem sabendo que não concordo com essa loucura.

- Yes!

E lá se foram os nobres vagabundos amigos. O rumo só Francisco sabia, mas João lhe dava forças e empolgação, enquanto Roberto permanecia calado.

“O grito veio do caminho das pedras, o lugar onde nunca tivemos coragem de explorar”, Francisco alertou aos amigos, que não hesitaram e adentraram no caminho desconhecido. Era um caminho estreito cheio de antigas edificações tomadas pelas florestas. Não se ouvi nada no caminho apenas o eco dos passos dos vagabundos.

“Deus do o que o que é isso?”, João se assustou ao ver um pequeno cipó no chão e o confundiu com uma cobra. Roberto riu, sem fazer provocações o sensato vagabundo limpou o caminho. “Venham é seguro. Eu só não sei para onde é que vamos fugir.”

Daqui até a eternidade


Entre eu e o resto,
você.
Carinhos e sorrisos.
Um período indeterminado
e só amor.
Com tantas opções,
preferimos a nós.

Comparar é besteira.
Vejo os mesmos erros meus
em você.

Quanta relevância.
Quanto egoísmo.
Quanto amor.
Quanto carinho.

Coisas que não deveriam lhe dar
são as frases sem nexo.
Um sentido falso com dor.
Endiabradas e sem mel.

Luto contra os meus demônios
Hora ganho, hora perco.
São coisas da vida.
São coisas entre nós.

Com vitórias e derrotas,
eu diria que tudo está em paz.

Daqui até a eternidade, meu amor.

Eu, eles e nós

Dois ou três passos.
Um olhar e um cumprimento.
Sorriso?
Sorte, em um dia comum.

O expediente.
Um dia quente de notícias.
Uma frase.
“Defendi a minha tese?”

Anos e meses
de olhares distantes.
Amizade por acaso.

Cotidiano de ódio.
Não é real.
É incrível.
Calma,
eles não são como nós

Wednesday, May 07, 2008

Arrumou os óculos, tirou o cabelo da testa e disse: “Muleque, vamo cola na Agustera?”

Primeiros dias de aula na faculdade de Jornalismo. Fiz algumas amizades com umas meninas doidas. Tudo muito empolgante, regado a pinga com limão.
Mas foi em frente ao bar que conheci um tremendo de um bobão, mas que, com certeza, o seu nome vai estar em livros nas estantes dos mais vendidos. Pensei: com esse jeitinho de falar devagar e escrito Fresno no seu All-Star, esse cara é viado.
De uma frase do revolucionário Che Guevara, surgiu o apelido. Ele pronunciava a frase de modo engraçado. “Terrrrrnura”, era assim que ele dizia. A mais doida das amigas que fiz, disse: “aeee vo te chama de terrr”. O apelido virou uma identidade de Ternura.
A primeira pinga. Em um dia normal de aulas, alguns amigos liderados por Ter decidiram tomar uma com limão. O resultado foi obvio. Entraram na aula com o bafo de cachaça e a cabeça longe da terra. Um deles até gorfou no banheiro. A professora, Marli, ficou chocada com a situação, mas nada fez a respeito.
Em trabalhos da faculdade fui salvo por ele muitas vezes. Sem querer querendo, abusávamos da boa vontade e ‘inteligência’ do Ter. Claro, o cara fazia os trabalhos muito rápido e com qualidade. Aprendi muito. “É eu to terminando o site, você só precisa fazer um texto simples, se quiser eu te ajudo.” Era bem ao estilo Joe Ramone, humilde e eficiente, simples e rápido.
O entrosamento com a galera do futebol (turminha do amendoim) afastou o Ter dos locões. Por pouco tempo. Ter conseguiu unir os loções com os amendoins.
Anos atrás tentamos firmar uma parceria em um projeto de blog que fracassou. A nossa idéia de criar um blog que publicasse textos de filosofias de botecos, até foi posta em prática, mas com o tempo perdemos o foco. Esse era o tão falado “Horizontes-Perdidos”. Uma brisa intensa.
Venho reparando em textos emocionantes, que o Ter escreve. Neles, é possível se sentir em histórias de filmes que passam na tua rua. É fantástico. Os personagens, fragmentos de sua personalidade, aparecem como você gostaria que eles estivessem. Recomendo à vocês que, leiam essas coisinhas e prestem bem atenção no coração de tolo, que o Ter tem. Isso não é uma história é só um comentário.
Arrumou os óculos, tirou o cabelo da testa e disse: “Muleque, vamo cola na Agustera?”